Ela dizia-lhe que ele tinha de escrever aquelas histórias. Histórias passadas há muito tempo. Histórias de jipes encravados nas praias do nordeste, histórias de amizades (ele gostava muito do lado esquerdo da vida) com trombadinhas miseráveis, carteiristas, pretos grandes, libaneses hospitaleiros, lutadores de capoeira, vendedores de praia, chulos italianos, guias (guias que levavam cadernos grandes cheios de fotos de mulheres nuas), lavadores de carros,
Hollywood, o homem que nos lavava o carro chamava-se Hollywood
coroas à procura de companhia no calçadão, argentinos aldrabões, velejadores ocasionais, polícias corruptos, repórteres de televisão local;
na televisão, passava uma reportagem sobre o homem que tinha cortado com uma faca romba as orelhas e o nariz de um jegue
donas de bordéis que recebiam coelhinhas da playboy, mulheres da vida em horas de descanso nas coberturas dos aparthoteis de S. Paulo, ricos nas suas festas privadas,
a casa, bem a casa tinha cascatas, cascatas enormes, e carpas, carpas enormes, no jardim e nos tanques e a filha do Sílvio Santos a ensinar samba a uns portugueses sem noção
histórias com mais putas, putas surfistas, putas caras, putas peludas, putas aladas, putas velhas, putas pobres e quadras de voleibol com movimentos e corpos perfeitos, vendedores de cocos, maconheiros, patricinhas, mauricinhos, igrejas ao final da tarde cheias de vestidos brancos
tudo tão branco, tudo tão original, tudo tão bonito
e até uma história com aquela puta risonha que
dentes alvos, boca grega, corpo geométrico, cabelo loiro e curto
dizia, rindo mais uma vez, chamar-se Leide Diana.